O Livro dos Espíritos
182 – Duração das penas futuras (3a. parte)
A questão 1009, ainda sobre o tema Duração das penas futuras, foi também respondida a Kardec pelos
espíritos Platão e Paulo, cujas respostas vamos agora estudar:
Questão 1.009 - "Assim, as penas impostas jamais o são por toda a eternidade?"
Respostas dos Espíritos:
"Guerras de palavras! Guerras de palavras! Ainda não basta o sangue que tendes feito correr! Será ainda preciso
que se reacendam as fogueiras? Discutem sobre palavras: eternidade das penas, eternidade dos castigos. Ignorais
então que o que hoje entendeis por eternidade não é o que os antigos entendiam e designavam por esse termo?
Consulte o teólogo as fontes e lá descobrirá, como todos vós, que o texto hebreu não atribuía esta significação ao
vocábulo que os gregos, os latinos e os modernos traduziram por penas sem-fim, irremissíveis. Eternidade dos
castigos corresponde à eternidade do mal. Sim, enquanto existir o mal entre os homens, os castigos subsistirão.
Importa que os textos sagrados se interpretem no sentido relativo. A eternidade das penas é, pois, relativa e não
absoluta. Chegue o dia em que todos os homens, pelo arrependimento, se revistam da túnica da inocência e desde
esse dia deixará de haver gemidos e ranger de dentes. Limitada tendes, é certo, a vossa razão humana, porém, tal
como a tendes, ela é uma dádiva de Deus e, com auxílio dessa razão, nenhum homem de boa-fé haverá que de
outra forma compreenda a eternidade dos castigos. Pois que! Fora necessário admitir-se por eterno o mal.
Somente Deus é eterno e não poderia ter criado o mal eterno; do contrário, forçoso seria tirar-se-Lhe o mais
magnífico dos Seus atributos: o soberano poder, porquanto não é soberanamente poderoso aquele que cria um
elemento destruidor de suas obras. Humanidade! Humanidade! Não mergulhes mais os teus tristes olhares nas
profundezas da Terra, procurando aí os castigos. Chora, espera, expia e refugia-te na idéia de um Deus
intrinsecamente bom, absolutamente poderoso, essencialmente justo._
(PLATÃO)
_Gravitar para a unidade divina, eis o fim da Humanidade. Para atingi-lo, três coisas são necessárias: a Justiça, o
Amor e a Ciência. Três coisas lhe são opostas e contrárias: a ignorância, o ódio e a injustiça. Pois bem! Digo-vos,
em verdade, que mentis a estes princípios fundamentais, comprometendo a idéia de Deus, com o Lhe exagerardes
a severidade. Duplamente a comprometeis, deixando que no Espírito da criatura penetre a suposição de que há
nela mais clemência, mais virtude, amor e verdadeira justiça, do que atribuis ao Ser infinito. Destruís mesmo a idéia
do inferno, tornando-o ridículo e inadmissível às vossas crenças, como o é aos vossos corações o horrendo
espetáculo das execuções, das fogueiras e das torturas da Idade Média! Pois que! Quando banida se acha para
sempre das legislações humanas a era das cegas represálias, é que esperais mantê-la no ideal? Oh! Crede-me,
crede-me, irmãos em Deus e em Jesus-Cristo, crede-me: ou vos resignais a deixar que pereçam nas vossas mãos
todos os vossos dogmas, de preferência a que se modifiquem, ou, então, vivificai-os, abrindo-os aos benfazejos
eflúvios que os Bons, neste momento, derramam neles. A idéia do inferno, com as suas fornalhas ardentes, com as
suas caldeiras a ferver, pôde ser tolerada, isto é, perdoável num século de ferro; porém, no século dezenove, não
passa de vão fantasma, próprio, quando muito, para amedrontar criancinhas e em que estas, crescendo um pouco,
logo deixam de crer. Se persistirdes nessa mitologia aterradora, engendrareis a incredulidade, mãe de toda a
desorganização social. Tremo, entrevendo toda uma ordem social abalada e a ruir sobre os seus fundamentos, por
falta de sanção penal. Homens de fé ardente e viva, vanguardeiros do dia da luz, mãos à obra, não para manter
fábulas que envelheceram e se desacreditaram, mas para reavivar, revivificar a verdadeira sanção penal, sob formas condizentes com os vossos costumes, os vossos sentimentos e as luzes da vossa época.
Quem é, com efeito, o culpado? É aquele que, por um desvio, por um falso movimento da alma, se afasta do
objetivo da criação, que consiste no culto harmonioso do belo, do bem, idealizados pelo arquétipo humano, pelo
Homem-Deus, por Jesus-Cristo.
Que é o castigo? A conseqüência natural, derivada desse falso movimento; uma certa soma de dores necessária a
desgostá-lo da sua deformidade, pela experimentação do sofrimento. O castigo é o aguilhão que estimula a alma,
pela amargura, a se dobrar sobre si mesma e a buscar o porto de salvação. O castigo só tem por fim a reabilitação,
a redenção. Querê-lo eterno, por uma falta não eterna, é negar-lhe toda a razão de ser.
Oh! Em verdade vos digo, cessai, cessai de pôr em paralelo, na sua eternidade, o Bem, essência do Criador, com
o Mal, essência da criatura. Fora criar uma penalidade injustificável. Afirmai, ao contrário, o abrandamento gradual
dos castigos e das penas pelas transgressões e consagrareis a unidade divina, tendo unidos o sentimento e a razão._
(PAULO, apóstolo)
QUESTÕES PARA ESTUDO
1.- Segundo o ensino de Platão, o que devemos entender por "eternidade das penas"?
2.- Como fica a crença no "inferno", segundo a orientação de Paulo?
3.- Qual o ensinamento de Paulo sobre as questões da culpa e do castigo?
Conclusão
1.- Segundo o ensino de Platão, o que devemos entender por "eternidade das penas"?
Platão conceitua a eternidade das penas como o tempo necessário para que o espírito em desalinho com a Lei
volte a se enquadrar aos seus ditames. Tão logo abandona a prática do mal, deixa de existir razão para o castigo,
que não tem outra finalidade senão recolocar o espírito no caminho do bem. Ressalta, ainda, que o sentido da
palavra eternidade, no seio do povo hebreu, diferia do que lhe é atribuído pelos povos modernos. Significava,
para aquele povo, a eternidade do mal, ou seja, o tempo pelo qual o mal ainda existisse. Enquanto existisse o mal,
o castigo subsistiria. Deus não seria soberanamente bom e justo se permitisse que o mal perdurasse eternamente,
nem teria a inteligência suprema, se permitisse um elemento destruidor de suas obras.
2.- Como fica a crença no "inferno", segundo a orientação de Paulo?
A crença no inferno, com suas fogueiras sempre ardentes a queimar o espírito infrator, num processo infindável,
eterno, sem nunca terminar de queimar, faz parte de uma época de grande atraso moral e intelectual da
humanidade. Era necessário criar-se algo que impusesse temor, como forma de conter aqueles espíritos ainda
embrutecidos que constituíam a humanidade encarnada do Planeta. Era uma época de temor a Deus e não de fé.
À medida que o progresso foi avançando, a crença num inferno eterno não somente foi se tornando desacreditada
como também foi perdendo a necessidade da sua manutenção. Hoje, embora ainda não totalmente banida, cada
vez mais pessoas vão sendo esclarecidas pela revelação espírita. Seu poder assustador foi bastante reduzido. A
Doutrina Espírita mostra a verdadeira sanção penal, baseada na lei de causa e efeito, segundo a qual a cada um é
dado segundo suas obras, como ensinou o Cristo, o que é bem mais condizente com os costumes de hoje e com
os atributos da Divindade.
3.- Qual o ensinamento de Paulo sobre as questões da culpa e do castigo?
Segundo o Apostolo dos Gentios, a culpa é decorrência de um desvio do espírito em direção contrária ao objetivo
da criação. Resulta do seu afastamento do bem. O castigo é a conseqüência natural, acinonada magneticamente
pelas leis e forças que regem o Cosmo. Funciona como um aguilhão que impulsiona o faltoso a buscar a sua
modificação. Seu único objetivo é a reabilitação. "Querê-lo eterno, por uma falta não eterna, é negar-lhe toda a
razão de ser", conclui Paulo.