O Livro dos Espíritos

181 – Duração das penas futuras (2a. parte)

A questão 1.009 do Livro dos Espíritos é respondida por vários espíritos, que dissertam sobre a temporariedade
das penas futuras. Vamos, nesta semana, estudar as respostas dadas a Kardec pelos espíritos Santo Agostinho
e Lamennais.

Na questão 1009, pergunta Kardec:

"Assim, as penas impostas jamais o são por toda a eternidade?"

Respostas dos Espíritos:

"Interrogai o vosso bom-senso, a vossa razão e perguntai-lhes se uma condenação perpétua, motivada
por alguns momentos de erro, não seria a negação da bondade de Deus. Que é, com efeito, a duração
da vida, ainda quando de cem anos, em face da eternidade? Eternidade! Compreendeis bem esta palavra? Sofrimentos, torturas sem-fim, sem esperanças, por causa de algumas faltas! O vosso juízo não repele
semelhante idéia? Que os antigos tenham considerado o Senhor do Universo um Deus terrível, cioso e
vingativo, concebe-se. Na ignorância em que se achavam, atribuíam à divindade as paixões dos homens.
Esse, todavia, não é o Deus dos cristãos, que classifica como virtudes primordiais o amor, a caridade,
a misericórdia, o esquecimento das ofensas. Poderia Ele carecer das qualidades, cuja posse prescreve,
como um dever, às Suas criaturas? Não haverá contradição em se Lhe atribuir a bondade infinita e a
vingança também infinita? Dizeis que, acima de tudo, Ele é justo e que o homem não Lhe compreende
a justiça. Mas, a justiça não exclui a bondade e Ele não seria bom, se condenasse a eternas e horríveis
penas a maioria das suas criaturas. Teria o direito de fazer da justiça uma obrigação para Seus filhos,
se lhes não desse meio de compreendê-la? Aliás, no fazer que a duração das penas dependa dos esforços
do culpado não está toda a sublimidade da justiça unida à bondade? Aí é que se encontra a verdade
desta sentença: "A cada um segundo as suas obras." (SANTO AGOSTINHO)

"Aplicai-vos, por todos os meios ao vosso alcance, em combater, em aniquilar a idéia da eternidade
das penas, idéia blasfematória da justiça e da bondade de Deus, gérmen fecundo da incredulidade, do
materialismo e da indiferença que invadiram as massas humanas, desde que as inteligências começaram
a desenvolver-se. O Espírito, prestes a esclarecer-se, ou mesmo apenas desbastado, logo lhe apreendeu
a monstruosa injustiça. Sua razão a repele e, então, raro é que não englobe no mesmo repúdio a pena
que o revolta e o Deus a quem a atribui. Daí os males sem conta que hão desabado sobre vós e aos quais
vimos trazer remédio. Tanto mais fácil será a tarefa que vos apontamos, quanto é certo que todas as
autoridades em quem se apóiam os defensores de tal crença evitaram todas pronunciar-se formalmente
a respeito. Nem os concílios, nem os Pais da Igreja resolveram essa grave questão. Muito embora, segundo
os Evangelistas e tomadas ao pé da letra as palavras emblemáticas do Cristo, ele tenha ameaçado os
culpados com um fogo que se não extingue, com um fogo eterno, absolutamente nada se encontra nas
suas palavras capaz de provar que o haja condenado eternamente.
Pobres ovelhas desgarradas, aprendei a ver aproximar-se de vós o bom Pastor, que,longe de vos banir
para todo o sempre de sua presença, vem pessoalmente ao vosso encontro, para vos reconduzir ao aprisco.
Filhos pródigos, deixai o vosso voluntário exílio; encaminhai vossos passos para a morada paterna. O
Pai vos estende os braços e está sempre pronto a festejar o vosso regresso ao seio da família." (LAMENNAIS)


QUESTÕES PARA ESTUDO:

1.- Segundo o ensinamento de Santo Agostinho, por que a doutrina das penas eternas é incompatível com a
idéia que o cristão deve fazer sobre Deus?

2.- Como surgiu a idéia das penas eternas?

3.- Por que o espírito Lamennais afirma que a doutrina das penas eternas pode levar à incredulidade e ao
materialismo?

4.- É compatível a doutrina das penas eternas com a da evolução do espírito, isto é, com o progresso das almas,
ensinado pelo Espiritismo?


Conclusão

1.- Segundo o ensinamento de Santo Agostinho, por que a doutrina das penas eternas é incompatível com a
idéia que o cristão deve fazer sobre Deus?

Porque uma condenação perpétua, motivada por alguns momentos de erro, contrariaria, irremediavelmente, o
atributo de bondade infinita da Divindade. Sendo o espírito imortal, uma pena de sofrimentos, não importa qual
tenha sido a falta cometida, constituiria uma tortura infinita, uma vida sem perspectivas, sem esperanças. Se, até
mesmo em nós, seres ainda muito distantes da perfeição relativa, essa idéia causa repulsa, como imaginar que
Deus, a perfeição absoluta, portador da bondade e da justiça ilimitadas, poderia instituir uma pena irremissível?
Jesus veio à carne para ensinar à humanidade o verdadeiro Deus, que é todo amor, justiça e bondade, que não
impõe a seus filhos uma penalidade irreversível. Sua lei é de amor, de caridade, de misericórdia, de perdão e
esquecimento das ofensas. Este é o Deus dos cristãos, que quer o bem de suas criaturas, dando-lhe todas as oportunidades para alcançá-lo. O Espiritismo, sendo a revivescência do verdadeiro ensinamento do Cristo,
tem um dos seus pilares no princípio evolucionista do ser. Repele, de forma categórica, a idéia das penas eternas,
por não ser compatível com o Deus misericordioso, em nome de quem Jesus veio à Terra.


2.- Como surgiu a idéia das penas eternas?

A idéia das penas eternas surgiu numa época em que a humanidade ainda se encontrava num estágio de
conhecimento muito atrasado, de grande ignorância. Todos os defeitos de que os homens eram portadores,
como as paixões e o desejo de vingança, eram atribuídas também a Deus. Por essa razão, até mesmo para se
impor algum temor que limitasse os excessos, surgiu a idéia de um Deus terrível e vingativo, que punia os faltosos
com todo o rigor da sua "justiça".


3.- Por que o espírito Lamennais afirma que a doutrina das penas eternas pode levar à incredulidade e ao
materialismo?

Uma pena irremissível, que não permitisse ao faltoso retomar o caminho do bem, denotaria um Deus injusto, que
puniria tão somente por vingança, fazendo o contrário do que Jesus ensinou. Nesse caso, a pena não teria qualquer
sentido corretivo. Um Deus dessa natureza torna-se-ia indesejado e desacreditado. Contra ele o homem somente
pode nutrir um sentimento de revolta e repulsa. Segundo o espírito Lamennais, não restaria ao homem senão o
sentimento de incredulidade, que leva, inevitavelmente, ao materialismo.


4.- É compatível a doutrina das penas eternas com a da evolução do espírito, isto é, com o progresso das almas,
ensinado pelo Espiritismo?

As penas eternas, tal como concebidas pelas religiões formais, seriam um obstáculo intransponível à evolução do
espírito. Uma vez sancionada, o espírito passaria todo o restante de sua existência, que não tem fim, sofrendo as
conseqüências do ato faltoso pelo qual foi julgado e condenado. Estaria impedido de progredir. Não estaria jamais
em condições de alcançar o reino dos céus prometido por Jesus. Seria o desmentido do que o Cristo afirmou, de
que nenhuma ovelha do rebanho do Pai se perderia. O espírito condenado à pena eterna estaria irremediavelmente
perdido, sem oportunidade de evoluir, o que Espiritismo veio demonstrar ser totalmente contrário à bondade e
justiça infinitas de Deus.