O Livro dos Espíritos

188 – C O N C L U S Ã O - Itens III e IV

III

Dizeis que desejais curar o vosso século de uma mania que ameaça invadir o mundo. Preferiríeis que o mundo
fosse invadido pela incredulidade que procurais propagar? A que se deve atribuir o relaxamento dos laços de
família e a maior parte das desordens que minam a sociedade, senão à ausência de toda crença? Demonstrando
a existência e a imortalidade da alma, o Espiritismo reaviva a fé no futuro, levanta os ânimos abatidos, faz suportar
com resignação as vicissitudes da vida. Ousaríeis chamar a isto um mal? Duas doutrinas se defrontam: uma, que
nega o futuro; outra, que lhe proclama e prova a existência; uma, que nada explica, outra, que explica tudo e que,
por isso mesmo, se dirige à razão; uma, que é a sanção do egoísmo; outra, que oferece base à justiça, à caridade
e ao amor do próximo. A primeira somente mostra o presente e aniquila toda esperança; a segunda consola e
desvenda o vasto campo do futuro. Qual a mais preciosa?

Algumas pessoas, dentre as mais cépticas, se fazem apóstolos da fraternidade e do progresso. Mas, a fraternidade pressupõe desinteresse, abnegação da personalidade. Com que direito impondes um sacrifício àquele a quem dizeis
que, com a morte, tudo se lhe acabará; que amanhã, talvez, ele não será mais do que uma velha máquina
desmantelada e atirada ao monturo? Que razões terá ele para impor a si mesmo uma privação qualquer? Não será
mais natural que trate de viver o melhor possível, durante os breves instantes que lhe concedeis? Daí o desejo de
possuir muito para melhor gozar. Do desejo nasce a inveja dos que possuem mais e, dessa inveja à vontade de
apoderar-se do que a estes pertence, o passo é curto. Que é que o detém? A lei? A lei, porém, não abrange
todos os casos. Direis que a consciência, o sentimento do dever. Mas, em que baseias o sentimento do dever?
Terá razão de ser esse sentimento, de par com a crença de que tudo se acaba com a vida? Onde essa crença
exista, uma só máxima é racional: cada um por si, não passando de vãs palavras as idéias de fraternidade, de
consciência, de dever, de humanidade, mesmo de progresso.

Oh! Vós que proclamais semelhantes doutrinas, não sabeis quão grande é o mal que fazeis à sociedade, nem de
quantos crimes assumis a responsabilidade! Para o céptico, tal coisa não existe. Só à matéria rende ele homenagem.

IV
O progresso da Humanidade tem seu princípio na aplicação da lei de justiça, de amor e de caridade, lei que se
funda na certeza do futuro. Tirai-lhe essa certeza e lhe tirareis a pedra fundamental. Dessa lei derivam todas as
outras, porque ela encerra todas as condições da felicidade do homem. Só ela pode curar as chagas da sociedade. Comparando as idades e os povos, pode ele avaliar quanto a sua condição melhora, à medida que essa lei vai
sendo mais bem compreendida e praticada. Ora, se, aplicando-a parcial e incompletamente, aufere o homem tanto
bem, que não conseguirá quando fizer dela a base de todas as suas instituições sociais! Será isso possível? Certo,
porquanto, desde que ele já deu dez passos, possível lhe é dar vinte e assim por diante.

Do futuro se pode, pois, julgar pelo passado. Já vemos que pouco a pouco se extinguem as antipatias de povo
para povo. Diante da civilização, diminuem as barreiras que os separavam. De um extremo a outro do mundo,
eles se estendem as mãos. Maior justiça preside à elaboração das leis internacionais. As guerras se tornam cada
vez mais raras e não excluem os sentimentos de humanidade. Nas relações, a uniformidade se vai estabelecendo.
Apagam-se as distinções de raças e de castas e os que professam crenças diversas impõem silêncio aos prejuízos
de seita, para se confundirem na adoração de um único Deus. Falamos dos povos que marcham à testa da
civilização (789-793).

A todos estes respeitos, no entanto, longe ainda estamos da perfeição e muitas ruínas antigas, ainda se têm que
abater, até que não restem mais vestígios da barbaria. Poderão acaso essas ruínas sustentar-se contra a força
irresistível do progresso, contra essa força viva que é, em si mesma, uma lei da Natureza? Sendo a geração atual
mais adiantada do que a anterior, por que não o será mais do que a presente a que lhe há de suceder? Sê-lo-á,
pela força das coisas. Primeiro, porque, com as gerações, todos os dias se extinguem alguns campeões dos velhos
abusos, o que permite à sociedade formar-se de elementos novos, livres dos velhos preconceitos. Em segundo
lugar, porque, desejando o progresso, o homem estuda os obstáculos e se aplica a removê-los.

Desde que é incontestável o movimento progressivo, não há que duvidar do progresso vindouro. O homem quer
ser feliz e é natural esse desejo. Ora, buscando progredir, o que ele procura é aumentar a soma da sua felicidade,
sem o que o progresso careceria de objeto. Em que consistiria para ele o progresso, se lhe não devesse melhorar
a posição?

Quando, porém, conseguir a soma de gozos que o progresso intelectual lhe pode proporcionar, verificará que não
está completa a sua felicidade. Reconhecerá ser esta impossível, sem a segurança nas relações sociais, segurança
que somente no progresso moral lhe será dado achar. Logo, pela força mesma das coisas, ele próprio dirigirá o
progresso para essa senda e o Espiritismo lhe oferecerá a mais poderosa alavanca para alcançar tal objetivo.


QUESTÕES PARA ESTUDO

1 - Por que a crença na imortalidade da alma contribui para tornar o homem melhor?

2 - Por que Kardec afirma que o sentimento de fraternidade não é compatível com a incredulidade?

3 - Qual a contribuição que o Espiritismo pode dar ao progresso da humanidade?


Conclusão

1 - Por que a crença na imortalidade da alma contribui para tornar o homem melhor?

Sabedor da sua imortalidade, o homem toma consciência de que a verdadeira vida é a espiritual. Passa a valorizar
as questões espirituais e a dar menos valor às questões ligadas à matéria, que são a causa do seu egoísmo e orgulho. Conhecendo essa nova forma de vida e que, nela, manterá a sua individualidade, o homem encontra estímulo para
se melhorar e procurar viver, cada vez mais, conforme as leis divinas, pois sabe que a vida futura será continuação
e conseqüência da presente. A certeza da continuação da vida após a morte do corpo físico torna o homem menos orgulhoso e menos egoísta, fazendo-o mais solidário e incentivando-o na busca da perfeição. Ao demonstrar a
continuação da vida, o Espiritismo fortalece a fé e renova as forças para o enfrentamento das vicissitudes com que
o espírito tem que se defrontar em sua experiência terrena.


2 - Por que Kardec afirma que o sentimento de fraternidade não é compatível com a incredulidade?

Se a vida terminasse no túmulo, tudo seria válido praticar para satisfizer as necessidades da matéria, pois nesta se
resumiria, em última análise, a própria existência. Kardec demonstra o mal que a crença no nada causa à sociedade.
Ao incrédulo, nada se opõe às suas necessidades de gozo. O sentimento de fraternidade não teria razão de ser. Se,
com a morte do corpo físico, tudo se expirasse, o mais natural seria procurar viver da melhor menira possível o curto período de vida, sem se importar com a sorte do próximo. Até mesmo os laços de família enfraquecer-se-iam, ante
a perspectiva de um rompimento definitivo.


3 - Qual a contribuição que o Espiritismo pode dar ao progresso da humanidade?

Segundo Kardec, a base do progresso da humanidade está na prática da lei de justiça, de amor e de caridade.
Essa lei, contudo, somente se afirmará inteiramente quando entre os homens predominar a certeza da vida futura. À
medida vai sendo melhor compreendida, a humanidade avança, conforme podemos constatar ao estudarmos a
história dos povos. O homem quer ser feliz e, para tanto, busca o progresso intelectual, que lhe proporciona uma
valiosa soma de gozos materiais. Sua felecidade, no entanto, não se completa com esses gozos, dos quais não se
pode desfrutar sem a segurança nas relações sociais. Somente com o progresso moral o homem encontrará essa
segurança, pondo fim às guerras, às antipatias entre povos e às distinções entre raças e religiões. O Espiritismo, com
sua doutrina assentada nos ensinamentos do Cristo e nas leis cósmicas do Criador, demonstrando a imortalidade da
alma, a vida futura, a reencarnação e a lei de causa e efeito é, conforme as palavras do Codificador, "a mais poderosa alavanca para alcançar tal objetivo".